Em 5 meses farei 37 anos. Em 3 anos e 5 meses farei 40. Tô próxima do que considero a exata metade da vida porque pretendo viver só até os 80. Mais do que isso é acréscimo desnecessário, prorrogação de um jogo onde não haverá vencedor.
Quem aqui ja passou dos 30 sabe como funciona o processo gradual e lento de desintegração do corpo e da mente. Lento por enquanto porque certamente a máquina de decomposição vai ser acionada com mais velocidade logo, logo e um belo dia você vai acordar, se olhar no espelho de manhã e enxergar coisas no rosto e no corpo que não estavam ali na noite passada. É fato. Aceite e viva muito melhor.
Até mais ou menos os 34 anos a pele do meu rosto era lisinha feito a bunda de um recém nascido e tudo o que tinha eram manchas causadas pelo excesso de hormônios das pílulas anticoncepcionais e uma pré disposição genética pra hiperpigmentação. Não havia marcas de expressão na minha testa, o canto dos meus olhos não enrugava quando eu ria e linhas não existiam ao redor da minha boca. Pois bem. Tudo isso começou a brotar no meu rosto inesperadamente, de repente, sem que eu pudesse fazer nada. Apesar de todos os cremes, de todos os tratamentos faciais, de toda a proteção, minha cara tá aos poucos se preparando pra velhice. E isso não é exagero, quem tem mais de 35 sabe bem do que eu to falando. E se não sabe é porque tem muita sorte, muito dinheiro ou nenhum espelho em casa.
A ficha dessa decomposição caiu no dia em que vi publicada uma foto minha num evento. Era uma foto de perfil e eu tava rindo muito de alguma coisa. Consegui contar pelo menos 15 rugas ao redor do meu olho direito e num primeiro instante tive vontade de morrer. Como foi que aquelas malditas foram parar ali? O que é que eu vou fazer agora? Gastar todo o meu salário em Botox e além da grana perder a expressão facial? Fazer uma cirurgia plástica e me transformar numa oriental? Me matar enquanto sou relativamente jovem pra chegar melhorzinha do lado de lá?
Olhando praquela foto, lembrei de uma frase que deve ter sido proferida por alguma mulher em que ela dizia que cada uma das rugas do seu rosto contava uma história sobre a sua vida. Não eram rugas de preocupação e sim, de experiências vividas. E comecei a pensar nisso mais profundamente pra poder dar um sentido mais poético para as malditas linhas que teimaram em se instalar no meu rosto. E consegui ver em cada uma delas uma etapa terminada da minha história e muitas ganharam inclusive um nome. Algumas são mais intensas e fundas e representam bem certas dificuldades que fui obrigada a enfrentar e vencer. Outras são mais suaves, mais recentes, mas mesmo assim tem seu significado na minha passagem por esse mundo. São como mapas indicando caminhos por onde andei.
Decidi encarar dessa forma o início do meu processo de envelhecimento. Decidi que nenhuma das marcas no meu rosto foram em vão e que por isso não vou apagá-las com procedimentos estéticos que jamais irão me devolver o tempo que passou e o frescor da juventude que um dia tive. Até que eu mude de ideia elas vão ficar aqui comigo, pra que eu possa me olhar diariamente no espelho e lembrar de tudo o que ja vivi e me preparar praquilo que ainda hei de viver.