Será uma analogia? Um grupo de galinhas, enfurnadas em uma granja, reunidas em uma assembléia secreta, firmam um pacto para se libertarem do arbítrio dos seres humanos. A líder, a persistente e idealista franguinha Ginger, alerta para “a pior cerca que existe. Aquela que habita em nossas mentes”, diante de uma momentânea apatia de seu grupo de seguidoras. Já dá para reparar, a essa altura, que não ser trata de um filme americano.

Obviamente a história é simples, na medida em que trata da saga de galinhas libertárias, misturando a política de Ken Loach com as aventuras de Indiana Jones. A química deu certo. O público que conseguiu ver à noite a versão legendada, não tinha ido atrás de um Bergman. Resultado: gargalhadas e torcidas em prol dos galináceos, em um público quase absolutamente adulto.

Pois é, bastou um olhar simples para captar o que a há de bom no filme: a genialidade de criar ótimos personagens, dotados de expressão dramática, contextualizados em suas culturas, mas que na verdade, são feitos de massinha! Destaque para o frango fanfarrão americano Rocky, que chega com seu jeitão de beatnik, querendo conquistar as gatinhas (digo, as galinhas) inglesas, com frases feitas bem americanas. Na voz de Rocky, nada mais do que o canastrão Mel Gibson, e na de Ginger, a atriz inglesa Julia Sawalha, do seriado Absolutely Fabulous. Claro que ainda há um pouco da natureza das galinhas em muitos das personagens, ou seja, algumas são extremamente burras.

O filme segue uma escola bem européia de animação, a de massinhas, e a Aardman Animation, número 1 no mundo no gênero, já acumulou 3 Oscars e diversas premiações desde sua fundação em 1972. Para quem é freqüentador assíduo do Anima Mundi, as produções da Aardman Animation já estiveram presentes em diversas edições da Mostra. Os filmes não fogem de histórias simples, muitas das vezes infantis, mas dotados de uma excelência técnica, não muitas vezes presentes nos filmes alternativos. O último do gênero foi o também elogiado Wallace and Gromit.

Para se ter uma idéia, cada segundo de movimento das galinhas feitas de massinha, compreendem 24 frames, ou seja, como se fossem batidas 24 fotos para fazer um movimento que dura um segundo. Haja técnica e sutileza para fazer com que essas galinhas dancem, gesticulem, façam caras, bicos, e demonstrem uma expressão corporal digna de um ser humano.

A técnica é particularmente apaixonante, e nos faz lembrar os seriados ingleses de massinhas para crianças, que assistíamos na TV Educativa, muitos deles produzidos pela própria Aardman. Pena que as galinhas não se desmancham e viram outras formas, como nas versões mais psicodélicas desse gênero de animação. Vale a pena.